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sexta-feira, 11 de agosto de 2006

PARA SUSTENTAR A GASTANÇA

Estadão
A notícia de que a fiscalização da Secretaria da Receita Federal vai agir com mais rigor daqui até o fim do ano, publicada na edição de segunda-feira do Estado, não deveria preocupar o contribuinte honesto. Se essa súbita predisposição dos fiscais para o trabalho tivesse como objetivo combater a sonegação que distorce a concorrência e premia os desonestos, os que recolhem em dia os tributos devidos só teriam a ganhar. Além disso, é obrigação da Receita identificar os que sistematicamente sonegam e cobrar deles os tributos não pagos - e esse tipo de ação deveria ser rotina, não tema de notícia.

Mas a notícia é preocupante. O que move a nova ação da Receita não é a promoção de condições de igualdade na concorrência entre os agentes econômicos, por meio da cobrança correta dos impostos. A ofensiva tem outros objetivos, todos condenáveis. Um é de natureza político-eleitoral, outro de características meramente financeiras, para beneficiar de maneira direta os fiscais.

O primeiro desses objetivos é assegurar o aumento de arrecadação para sustentar o aumento dos gastos do governo, que estão crescendo de maneira notável neste ano eleitoral. A meta dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento é o aumento de R$ 4,5 bilhões na arrecadação prevista para este ano. Ou seja, o que se quer é tirar mais dinheiro do contribuinte para sustentar a gastança eleitoral do governo Lula.

Boa parte dessa receita adicional cairia nos cofres públicos sem grande esforço, de qualquer maneira, pois decorre da atividade econômica e da alta do petróleo, que tem feito crescer o volume de impostos pagos pelo setor petroleiro.

O problema é que o governo Lula vem gastando essa receita adicional antecipadamente. Na semana passada, por decreto, aumentou em R$ 4,8 bilhões os recursos destinados aos Ministérios dos Transportes e do Desenvolvimento Agrário.

A Receita Federal conta também com o efeito do início da vigência do Refis 3, o terceiro programa de renegociação de dívidas tributárias adotado pelo governo federal, que oferece descontos para o pagamento à vista e facilidades para o parcelamento da dívida tributária.

Embora no médio prazo esse programa, como os dois que o antecederam, deva apresentar resultados pífios em termos de arrecadação, no curto prazo seu efeito pode não ser desprezível. Os descontos oferecidos para o pagamento à vista do débito tributário podem interessar a um certo número de contribuintes, enquanto os que optarem pelo parcelamento terão de fazer algum pagamento inicial.

Outra parte do aumento da arrecadação decorrerá do maior esforço da fiscalização, tanto na área específica da Receita como na da Previdência Social. Os auditores fiscais já esfregam as mãos e pensam em ações que resultem em aumento expressivo da arrecadação. O motivo de tanta animação não é a cobrança correta dos tributos, mas assegurar ganhos pessoais.

"O governo vinculou o reajuste salarial da categoria ao cumprimento da nova meta de arrecadação", disse à repórter Lu Aiko Otta, do Estado, o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco), Carlos André Soares Nogueira. Se a meta for cumprida, os ficais em atividade terão aumento de cerca de 34% e os aposentados, de 30%. Nada mau numa economia que registra inflação anual de cerca de 4,5% e até menos, dependendo do índice que se utilizar.

Diretamente interessado, pois, nos resultados da arrecadação, o Unafisco já sugeriu à Receita uma fiscalização mais intensa das operações de crédito tributário, por meio das quais uma empresa quita tributos utilizando aqueles que pagou indevidamente em outras operações. Empresas que produzem para exportação, por exemplo, costumam ter direito a créditos tributários (em tese, não incide tributo sobre o bem exportado), que podem utilizar para quitar outros impostos.

"Há um estoque de R$ 70 bilhões em compensações que precisariam ser revistas", disse o presidente do Unafisco, já mostrando onde a fiscalização poderá concentrar seu trabalho nos próximos meses. Se essa área não produzir os resultados esperados em termos de arrecadação - pelo governo gastador e pelos fiscais interessados em ganhar mais - outras serão identificadas.

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