Pesquisar este blog

quinta-feira, 2 de novembro de 2006

Delegado acusa PF de ‘abafa’ no caso do dossiê
Do Estadão -

Delegado acusa PF de ‘abafa’ no caso do dossiê

Antes das prisões em SP, no dia 15 de setembro, chefe de Edmilson Pereira Bruno teria alertado sobre risco de mexer com ‘peixe grande’

No depoimento que prestou ao Ministério Público Federal sobre a prisão dos petistas Gedimar Passos e Valdebran Padilha - com R$ 1,75 milhão destinados à compra de um dossiê contra candidatos tucano -, o delegado Edmilson Pereira Bruno disse que seus superiores tinham grande preocupação com o modo como conduziria o caso. E afirmou que o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, mostrou-se apreensivo com a eventual menção, nos depoimentos, de qualquer coisa que pudesse sugerir uma ligação entre os presos e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O depoimento ao MPF, ao qual o Estado teve acesso, foi tomado em 23 de outubro. O delegado, tratado no documento como interrogando, foi ouvido pelos procuradores Roberto Diana, Melissa Garcia Abreu e Elizabeth Kobayashi.
Ele conta que em 15 de setembro, pouco antes de sair rumo ao Hotel Ibis Congonhas, onde foram feitas as prisões, recebeu do diretor da PF em São Paulo, Severino Alexandre, uma advertência: “Olha bem o que você vai fazer. Está mexendo com peixe grande. Tudo o que fizer será responsabilidade sua.”
Esse teria sido o primeiro de uma série de cuidados que lhe foram cobrados. Outros se seguiram quando todos se dirigiram à sede da PF, onde foram recebidos por Severino e pelo superintendente regional, Geraldo José Araújo.
Ele afirmou que pouco antes das 11 horas daquele dia, quando as prisões já estavam feitas e se aguardava a chegada do dossiê, Severino Alexandre “mandou que todos fossem para a PF imediatamente”. Chamado ao 9º andar da sede, na sala onde estavam Araújo e o diretor, “só neste momento o superintendente Geraldo ficou sabendo da detenção de Gedimar”. Da mesma forma, só então ele soube “que os detidos alegavam que o dinheiro era oriundo do PT”. O superintendente e Severino “ficaram surpresos com a participação de Gedimar nos fatos, demonstrando serem amigos dele e dizendo ‘é gente nossa, de confiança’ por várias vezes”.
‘PREOCUPAÇÕES COM LULA
Bruno disse que em seguida o superintendente entrou em contato com Thomaz Bastos, que perguntou “se os detidos falavam do presidente Lula, o que o superintendente, após consultar o interrogando, responde que não, apenas mencionando o Diretório Nacional do PT”. E acrescentou: “O superintendente, respondendo a indagações do ministro, afirma que não haveria prisão nem seriam tiradas ou divulgadas fotos do dinheiro apreendido.”O delegado contou que ainda no 9º andar recebeu de Severino instruções num canto da sala. Mandou “que fosse cumprido estritamente” a ordem de prisão. Ele “devia ser ‘curto e grosso’ nas perguntas a Gedimar e Valdebran, devendo agir como ‘um macaco, que não fala, não ouve e não vê’”.
Quando Valdebran passava outras informações, o superintendente “mandou parar tudo e que os celulares fossem desligados”.
Ele dá conta, ainda, do empenho de Gedimar e Valdebran em alterar as informações que haviam dado à polícia no momento da prisão. Eles “não quiseram que tudo o que haviam dito no hotel constasse das declarações colhidas formalmente” e “fizeram com que as declarações fossem alteradas algumas vezes”.
Além disso, durante o depoimento dos detidos, o superintendente “conversou reservadamente com o interrogando, dizendo que o diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, ligara opinando pela feitura do flagrante, mesmo procedimento do famoso caso de dólares na cueca”. E acrescentou: “O superintendente deixou claro que o ministro Thomaz Bastos demonstra preocupação política e com a figura do presidente Lula, por isso, não queria o flagrante, nem fotos; enquanto o diretor-geral Lacerda preocupava-se com a imagem da PF como instituição”.
Por fim, o delegado disse que só em casa lembrou-se “do circuito de TV do hotel, cujas imagens permitiram identificar o doleiro do PT mencionado no depoimento de Gedimar”. Bruno contou que acertou a busca do material com a gerência do hotel, mas na segunda-feira, dia 18, soube que para isso dependia de autorização de Severino. “Foi até Severino, o qual negou autorização, dizendo que o interrogando não tinha mais nada a ver com o caso e a diligência competia à PF/Cuiabá”.