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terça-feira, 7 de agosto de 2007

Lula ignorou o aviso de Lula

Como alguns refrigerantes,Lula só superou os concorrentes e consolidou-se no topo do ranking depois de ter-se convencido das vantagens da diversificação. O Lula Clássico, oferecido nacionalmente em 1989, 1994 e 1998, nunca foi além de 30% da freguesia. Seria assim também em 2002 se não fosse lançado o Lula Light, concebido para atrair os que achavam muito amargo o produto original. Somadas as versões, a marca conquistou a liderança do mercado. E o poder.

Nos últimos quatro anos e meio, o clima do Brasil Central e a adição de substâncias obtidas apenas no laboratório do Planalto permitiram o surgimento de mais subprodutos da fórmula-mãe: o Lula-que-Tudo-Sabe e o Lula-que-Nada-Soube. O primeiro, apresentado já nas primeiras semanas de 2003, é vendido o ano inteiro. A distribuição do segundo é sazonal.

O Lula-que-Nada-Soube é reapresentado ao país sempre que os estrondos da crise ecoam no coração do governo e perturbam o sono do maior governante desde as caravelas. É a versão que refresca, relaxa, acalma, conforta, reanima. Convida a acreditar que o chefe é sempre o último a saber das bandalheiras, mesmo se ocorridas na sala ao lado ou na casa do irmão. Não peca jamais. Os culpados são os outros.

A marca é bastante apreciada tanto pela gente dos grotões, que não distingue guaraná de tubaína, quanto por intelectuais arrendados pelo governo, todos rendidos à teoria do bom primitivo. Mas sempre teve sabor da Paraguai, seja qual for a versão, para brasileiros cujo paladar não foi embrutecido pela ignorância nem envilecido pela vassalagem. Para os habitantes da ilha dos resistentes, a mera contemplação do conjunto de versões, promovida pelo agravamento do apagão aéreo, é decididamente intragável.

"Temos problemas em alguns aeroportos, mas não existe crise", fantasiou em novembro passado o Lula Light. "Quero um prazo, com dia e hora, para comunicar ao país que os aviões voltaram a voar normalmente", trovejou semanas mais tarde o Lula Clássico. Ignorado o ultimato, os quatro modelos silenciaram para que por eles falassem os idiotas-do-cerrado e os cretinos fundamentais.

A tragédia imensa em Congonhas interrompeu a mudez. "Todos sabemos que existe uma crise no setor aéreo, mas o governo está tomando providências para resolver o problema o quanto antes", discursou o Lula-que-Tudo-Sabe uma semana depois do acidente inverossímil. "Eu não sabia da crise", recitou na segunda-feira o Lula-que-Nada-Soube.

No dia seguinte, ao receber três parentes de vítimas do vôo da TAM, essa mesma versão de Lula simulava a expressão de quem logo se tornaria o número 200 da lista de mortos. "Essa questão aérea é como uma metástase que o paciente tinha, mas não sabia que tinha", comparou o enfermo imaginário. "Nunca se falou desse problema antes". A mentira foi enterrada no momento da exumação, 48 horas depois, de um artigo assinado pelo Lula Clássico que ocupou a Gazeta Mercantil de 7 de janeiro de 2002.

"Morte anunciada do transporte aéreo", resume o título do texto, que começa por lamentar a agonia da Transbrasil e termina com uma pergunta a Fernando Henrique Cardoso: "Até quando, senhor presidente?". O colapso antecipado pelo artigo que alguém escreveu por Lula, incapaz de juntar sujeito e predicado, consumou-se no governo de quem o assinou.

E agora, senhor presidente?



Coluna - Coisas da Política - Augusto Nunes
Jornal do Brasil

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